quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Os pés

Meu corpo acordou confuso. Os pés devem fixar-se na terra? Os pés devem caminhar? Ando de um lado ao outro no quarto sem saber o que espero, sem entender o que quero, sem compreender porquê me desespero. Entre o tum e o outro tum do meu coração há um vago ou uma vaga. Não sei. Tanto mar aqui! Audrey, na parede, olha-me inquisitiva. As bailarinas sobre a escrivaninha deixaram de lado o seu bailado e agora acompanham o meu movimento de um lado ao outro do quarto. Movimento. Os astros neste mesmo momento se movimentam, mas não sei se a nosso favor. Acho que estão contra nós. Teus insensíveis gestos suaves me oprimem. Mas teus olhos não se fixam nos meus. Por que eles mentem tanto? Acho que a tua boca não conhece as inverdades do teu olhar. E eu, que queria tanto, ao menos uma vez, ter dançado contigo, fujo das mentiras dos teus olhos. Agora até a adaga de Sevilha fala. Não. Canta. Mas ao seu belo flamenco ignoro. Assim como as cortinas, ela só sabe seduzir à escuridão. Todos os livros da estante opinam sobre o que era aquele teu silêncio glacial. São tantas vozes que já nem escuto. Não importa. Agora só há o movimento. Teu movimento sobre o mar. Meu movimento sobre a terra. Eu, que por instantes fui Penélope, relembro que nasci Odisseu.

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