sábado, 13 de outubro de 2012

Das ascensões e declínios das paixões (parte 1)

Voltou os olhos para o além-mar. Abandonou. Abandonou-se. Ainda perguntava-se se de fato voltara. E, enganando-se, dizia que sim. Quem foge da liberdade? Talvez quem fuja sinta-se livre para fugir. Em terra de certezas, permanecia uma interrogação. Quis correr para sentir o vento no rosto tal como antes sentia. Não correu muito. Cansou. Parou. Sentou-se no chão. Viu as horas. As horas. Malditas horas! Corriam demais. Demoravam demais. Horas e seus ais… Chorou. Lembrou das palavras da avó que sempre dizia que as lágrimas limpam a alma. Pensava ter banalizado seu choro. Por tanta coisa boba já deixara-se escorrer! Mas quem , afinal, determina o por quê se é justo chorar? Viu o sol querer desaparecer no horizonte. “Meu sol”, sussurrou ao vento . E esperou que seu sussurro fosse pelo vento entregue ao seu verdadeiro dono. Lembrou do velho caderno. O velho caderno foi esquecido. Não. Foi deixado. O caderno esperaria por um leitor na última gaveta da cómoda do corredor. Aquela que ninguém nunca abre. A gaveta aonde guardava-se fotos antigas, velhitas e já danificadas. Alguns trabalhos de tricô já manchados pelo tempo. Um sapatinho de bebé azul e sem par. Folhas de outonos passados. As folhas do seu caderno eram do outono passado. Outono. Pensara ter morrido junto com o outono. Não morreu. Talvez a vida não seja assim tão frágil. A morte pareceu-lhe muito mais delicada. Fugiu. Foi pelo medo do declínio que fugiu. Agora sabia. Cansou-se de estar sentada. Poderia deitar-se no gramado. Ver o céu. Contar estrelas. Não. Levantou-se. “Está feito”. E o vento parou.

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